Os conselhos de Jetro mudaram o rumo do povo de Israel com um modelo de liderança utilizado até hoje.
No tocante ao mundo corporativo, há uma belíssima passagem narrada no capítulo 18 do livro do Êxodo em que o escritor bíblico conta como o patriarca Moisés foi orientado pelo sogro Jetro durante uma espécie de consultoria.
Após a fuga do Egito e passar a pé enxuto pelo Mar Vermelho com todo o povo recém-libertado, Moisés acampou no deserto e logo depois recebeu a visita de sua mulher e filhos levados por Jetro. Cumprimentaram-se amavelmente, relataram um ao outro tudo o que havia acontecido durante o tempo em que permaneceram distantes e depois foram descansar.
No dia seguinte, contudo, o sogro já percebeu que havia algo de errado na liderança de Moisés quando viu uma imensa fila de pessoas aguardando horas até serem atendidas por ele. “O que é que você está fazendo com o povo? Por que se senta sozinho, enquanto eles o procuram de manhã até a noite?" , perguntou. Mas, certo de seu comportamento, Moisés respondeu que este era o seu trabalho, afinal todos esperavam que ele resolvesse as pendências com base nas leis de Deus.
Parecia um argumento sólido, no entanto Jetro reforçou: “O que você está fazendo não é certo. Está matando a si mesmo e ao povo que o acompanha, já que é uma tarefa muito pesada e você não pode cumpri-la sozinho”. E o aconselhou: “Represente o povo diante de Deus, ensine a ele as leis, faça com que conheça o caminho a seguir e as ações que deve praticar” . Na linguagem empresarial, atue estrategicamente.
E a seguir recomendou a criação de um grupo tático-operacional composto por homens capazes, de bom caráter e tementes a Deus, completando: “Estabeleça-os como chefes de mil, de cem, de cinquenta e de dez. Os assuntos graves, eles trarão a você; os assuntos simples, eles próprios resolverão. Desse modo repartirão a tarefa e você poderá realizar a sua parte”. Ou seja, receitou a descentralização.
Mas Jetro estava consciente de que o genro não deixaria o comportamento paternalista de lado a fim de assumir um novo modelo de gestão sem um argumento sólido. Por isto, foi persuasivo: “Se você fizer assim e Deus lhe der as instruções, poderá suportar a tarefa e o povo voltará para casa em paz".
No versículo 24 a história diz que Moisés aceitou o conselho do sogro e fez exatamente aquilo que ele havia dito, porém não pense que foi uma tarefa fácil. Conforme a passagem de Números 26,51 pouco mais de 601 mil pessoas estavam acampadas e nesta conta só entravam os homens adultos, desconsiderando mulheres e crianças. Portanto, fazendo uma conta aproximada, ao todo eram necessários nada menos que 76.800 líderes para sustentar a estrutura organizacional recomendada por Jetro.
A ironia é que hoje em dia muitos consideram difícil formar um simples substituto para os seus cargos, mesmo contando com uma série de pessoas pós-graduadas na empresa, e Moisés construiu um time e tanto 3300 anos atrás só com iletrados.
O que mais me encanta é o fato de que este líder bíblico aprendeu de verdade a lição recebida. Em Deuteronômio 1,9-15 ele já prega a terceiros o conselho do sogro e explica em detalhes como este modelo de gestão facilitará o trabalho de quem se encontra à frente.
As empresas bem-sucedidas têm pessoas como Jetro em seus quadros, que atuam como mentores das grandes mudanças e são hábeis ao comunicarem ideias a quem tem o poder de executá-las. E elas também atraem profissionais como Moisés, que mesmo nos altos postos de comando, abrem-se ao novo e conservam a humildade de escutar quem não está infectado pelo modus operandi.
Wellington Moreira
wellington@caputconsultoria.com.br